quarta-feira, 13 de outubro de 2010

Alentejo – Foto Nostalgia - Ferrador um ofício do passado

Na Arronches rural dos anos de 1930/45 na quase totalidade dos lares arronchense havia pelo menos um ou dois animais de tracção ou carga, donde se conclui a importância da profissão de ferrador.

Os muitos animais usados para puxar veículos ou para transportar cargas, precisavam de ser ferrados de forma a proteger os seus cascos de choques contra os maus caminhos de antigamente e pudessem suportar elevadas pressões resultantes de cargas ou da tracção de veículos.

Em Arronches funcionaram diversas oficinas de ferrador, as últimas conhecidas foram as do mestre Mira que mais tarde deixou o negócio ao seu empregado Chico, mestre Zé Ferrador e ainda a que chegou aos nossos dias, a do Mestre Manuel Branco, situada ao final da rua da Esperança.

Na oficina do ferrador havia uma estrutura muito sólida que chamava a atenção, era o tronco; nele eram imobilizados animais para serem ferrados.

Mulas, cavalos e burros eram geralmente ferrados sem entrarem no tronco.

O ferrador, de costas virado para o animal, levantava-lhe a pata a ferrar e segurava-a entre as suas pernas. Tirava-lhe a ferradura velha com uma grande turquês. Depois cortava com um formão um pouco de casco. Alisava o casco com uma grosa e aplicava-lhe, a seguir, com grandes marteladas numa bigorna, uma nova ferradura, ajustada ao tamanho da unha do animal. Agora com um martelo espetava os cravos – uns pregos que eram enfiados em buracos da ferradura. Os cravos eram espetados de modo oblíquo relativamente à pata. Depois o ferrador cortava e limava com uma grosa as pontas dos cravos que saíam do casco.

Existiam algumas “bestas velhacas” ou “bestas brabas”, curiosas expressões que designavam animais pouco ou nada mansos. Para serem ferradas eram imobilizadas no tronco. Se necessário, punha-se-lhes uma coisa na boca, chamada aziel, para evitar que mordessem.

Os bois eram ferrados no tronco, não pela sua braveza mas por serem animais pesados. A pata a ferrar repousava num suporte.

Por norma existia sempre por perto da oficina do ferrador uma taberna, local muito frequentado enquanto se aguardava pela vez de ferrar o animal, bebendo uns copos com amigos e conhecidos. Ou então aguardava-se ali por perto do tronco do ferrador, um local excelente de convívio, onde nunca faltava gente para contar e ouvir histórias e novidades.

Em todo o Alentejo os ferradores percebiam muito de doenças de animais, sendo muito procurados quando algum animal adoecia. Eram uma espécie de veterinários formados na escola da vida, aconselhando sobre cuidados a ter com os animais ou preparando mesmo produtos para lhes administrar.

Isto faz recordar uns versos que constavam dum livro da instrução primária de há muito tempo e que, com possíveis lapsos, aqui se reproduz

Certo médico afamado,
Tendo doente um jerico,
Mandou chamar um ferrador
Para curar-lhe o burrico.

Pronto o bicho, quanto devo?
Pergunta o Dr. Fabrício.
Nada, que nós não levamos dinheiro
Aos que são do mesmo ofício.

Exista ainda uma expressão relacionada com o ofício de ferrador – “dar uma no cravo e outra na ferradura”, que significa dar um golpe certo e outro não, dizer duas coisas contraditórias, acertar numas respostas e noutras não, responder atabalhoadamente, não dizer toda a verdade, ou ainda quando com arte e engenho se deixa recados aos poderes instituídos.

Deixamos esta foto (Nostalgia) registada na oficina do mestre Manuel Branco.

(Nostalgia é um sentimento que surge a partir da sensação de não poder mais reviver certos momentos da vida).

Estas memórias tiveram a colaboração do Mestre Manuel Branco e do Sr. Caetano Delgado.

Fonte: Poema – Associação de Mouriscas

1 comentário:

  1. Enfim memórias que Arronches deveria saber preservar para as gerações vindouras mas pelo que se tem visto nem a Escola vai por esse caminho, futebóis e touradas isso é que está dar.
    Admiro o vosso contributo para relembrar que Arronches é muito mais que simples festarolas.

    M. Bocas

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